O modelo de boa gestão de parques públicos urbanos já existe: é a parceria da prefeitura e/ou estado com organizações da sociedade civil sem fim de lucro, na qual podem participar, também, empresas. A gestão na mão de um só ator, de uma empresa com fim de lucro, e, ainda por cima, sem um Plano Diretor detalhado que garanta a preservação do parque, do seu paisagismo, da sua flora e fauna, da sua história e, enfim, do seu patrimônio arquitetônico é um verdadeiro suicídio social e um ataque à identidade citadina.
O famoso Parque das Águas de Caxambu, em Minas Gerais, está vivendo um momento parecido com o do Parque Ibirapuera. A empresa estadual ao qual pertence (CODEMIG) quer impôr uma concessão a um ator único, uma empresa de exploração das águas minerais, sem consultar a população, sem ouvir as organizações dedicadas à preservação desse parque histórico e do seu patrimônio e, o que é ainda mais grave, sem um Plano Diretor rigoroso, que garanta a sua preservação e o usufruto por parte da população, que é, na verdade, o verdadeiro proprietário desse patrimônio.
Leia,abaixo, o artigo de Nicolas Dinamarco, que faz o ponto da situação sobre o Parque das Águas de Caxambu – e veja quantas semelhanças (e quanta superficialidade por parte dos órgãos públicos) na tentativa de impôr uma concessão mal vista pela população, sem nenhuma garantia de que o parque será devidamente preservado no seu caráter histórico e natural.
PARQUE DAS ÁGUAS DE CAXAMBU: DO DESCASO ÀS INÚMERAS POSSIBILIDADES
Coluna Paixões e Perspectivas – Nicolas Dinamarco
Não é de hoje que a situação do Parque das Águas de Caxambu é alvo de críticas por parte da população e visitantes. Faz um bom tempo que o descaso e o aspecto de abandono constituem a paisagem do principal ponto de nossa cidade. Mas por que, apesar de um consenso a respeito da má gestão ou mau aproveitamento desse bem, nada muda com o passar dos anos? A resposta talvez esteja na falta de um debate franco sobre o assunto e na falta de unidade entre as partes interessadas.
Para chegarmos ao atual cenário, é necessário recapitular algumas questões. O Parque das Águas de Caxambu é uma propriedade da CODEMIG, empresa pública controlada pelo estado de Minas Gerais. Porém, de 1989 até 2017, o Parque se encontrava sob concessão da prefeitura de Caxambu. Nesse largo período, nosso parque passou por momentos de bonança, mas nos últimos anos, os problemas ficaram em constante evidência e predominou a sensação de que o lugar estava sendo explorado (no bom sentido da palavra), muito abaixo de seu potencial. Essa ineficiência se revela pela dificuldade das administrações em acompanhar as novas exigências surgidas ao longo do tempo nos âmbitos da administração pública, do mercado e da sociedade. Também por questões financeiras, pela falta de transparência e pela incapacidade da prefeitura, sozinha, gerir esse bem.
Ainda que o diagnóstico dos últimos anos seja negativo, como apontado, nada justifica a decisão autoritária da CODEMIG de assumir a gestão do Parque das Águas e lançar um edital de concessão da exploração das águas minerais por uma empresa privada, sem antes constituir um amplo diálogo com a sociedade, poder público local e outros interessados diretos. Não quero, de maneira alguma, demonizar o setor privado ou uma eventual participação da CODEMIG. Pelo contrário, penso ser indispensável a participação de empresas em uma gestão do Parque e das águas. Minha crítica se baseia na falta de participação na decisão, na ausência de um controle social em relação à exploração das águas e nos grandes riscos ambientais e sociais que a medida representa.
Vivemos um dilema. Dizer que antes estava bom seria demagogia, seguir por um caminho diferente cometendo erros do passado, não me parece conveniente. É preciso, portanto, nos indignarmos com a situação, lutarmos para revertê-la e pensarmos um novo e moderno modelo de gestão para o Parque das Águas de Caxambu.
Um modelo de gestão que envolva a CODEMIG, prefeitura, organizações da sociedade civil, conselhos de bairros, órgãos ambientais e empresários. Não existe a necessidade de concentrar a administração do Parque nas mãos de um único ator. Compartilhar essa gestão é um caminho para que se tenha uma representatividade real e para que seja estabelecido através de um conselho administrativo, um projeto e uma política de desenvolvimento de curto, médio e longo prazo – para que possamos pensar para além da efemeridade dos governos.
Citei a gestão compartilhada como alternativa, mas podemos pensar em diferentes métodos mais eficientes e eficazes do que o atual para gerir essa riqueza. O importante é não perdermos de vista o papel ambiental, social e econômico que o Parque das Águas representa. Compreender o Parque como parte da cultura dos caxambuenses e democratizar seu acesso à população local. Criar atrativos e negócios sustentáveis em suas dependências. Agregar valor às nossas águas e vendê-la como um produto diferenciado, como de fato é. Pensar em um turismo de saúde e bem-estar como fonte de renda do município. Transformar o Parque em um lugar de cultura, de educação, de pesquisa, esporte e lazer. São inúmeras possibilidades!
O caminho é longo e difícil, mas não podemos desistir dessa benção natural que muito se relaciona com nossa história e nossos hábitos. É ano de eleições, ótima oportunidade para cobrarmos uma posição daqueles que almejam ser nossos representantes, principalmente na esfera estadual. Somos privilegiados por sermos caxambuenses, mas esse patrimônio não é só nosso, é um Patrimônio da Humanidade e assim precisa ser reconhecido e pensado.
Que dias melhores possam estar em nosso horizonte!
Artigo publicado no Jornal Tribuna Sul de Minas em 7 de julho de 2018 (http://tribunasuldeminas.com.br/parque-das-aguas-de-caxambu-do-descaso-as-inumeras-possibilidades-5470).