Recentemente, lendo os comentários a uma publicação da página Facebook do Parque Ibirapuera Conservação sobre a invasão dos quiosques de alimentação e o seu impacto visual negativo (para não falar da roda gigante), verifiquei o seguinte: os comentários elogiosos à gestão privada (com fim de lucro) do Parque Ibirapuera eram, via de regra, acompanhados da frase “os banheiros estão limpos e há mais opções de comida”. A frase era quase uma litania, repetida em coro, na maior parte dos casos, por jovens de ambos os sexos.
Em nenhuma delas, lia-se: “ampliaram o verde”, “há mais avifauna do que antes”, “a marquise foi recuperada” ou “o lago está mais limpo”. A falta dessas observações nos revelam com precisão milimétrica o tipo de público que aplaude essa nova gestão: é o público do pior consumismo, que não é capaz de se relacionar com a natureza – que é o que um parque urbano oferece de único e insubstituível. Esse público pretende que o parque tenha as comodidades de um shopping center. O banheiro e a comida tornam-se os elementos mais importantes, mesmo que isso seja em detrimento da própria ideia de parque.
Li, também, o seguinte comentário: “Parque não é só mato”. Esse “mato”, lembrando uma expressão famosa e desprezível de quem nos desgoverna atualmente: “a porra da árvore”. Esse comentário, para além de revelar desprezo em relação ao verde urbano, mostra a confusão entre parque verde/áreas verdes e parque de diversões, que, em princípio, não precisa do verde – aliás, o verde se torna um empecilho, pois limita o espaço da parafernália de brinquedos, barracas, cartazes, etc..
Definitivamente, essas pessoas não sabem se relacionar com e não reconhecem a importância e a preciosidade dos espaços verdes na cidade
É natural que encontrar banheiros limpos é algo positivo – mas não quando o preço a pagar é uma gestão que invade o espaço natural e público com merchandising, barracas de alimentação, roda gigante e cartazes publicitários. Não quando a concessionária procura interromper as atividades da Escola de Música do Auditório – um verdadeiro marco e orgulho do parque. Não quando a Oca está descascando miseravelmente sem que alguma coisa seja feita…
Mas, quando a única preocupação é banheiro limpo e comida, esses “detalhes” não são vistos. Desafio qualquer um a pedir para essas pessoas identificarem o nome das árvores ou dos pássaros no parque. Vão considerar a pergunta esdrúxula e irritante. Mas, se lhes perguntarem o nome das opções de comida, responderão com precisão e detalhes.
E, se cobrassem da concessionária o conserto da marquise ou maior limpeza no lago, descobririam que esses dois quesitos estão fora do contrato de concessão e que continua cabendo à Prefeitura (e ao bolso do contribuinte) a responsabilidade da sua manutenção.
“Privatiza que melhora!”, era a palavra de ordem. Melhora o quê e para quem? Com certeza, melhorou para os incontinentes e os glutões, que, parece, não podem fazer cocô antes de sair de casa e levar um lanchinho na mochila. Para quem procura a contemplação da natureza, um pouco de calma e silêncio, piorou – e muito.
Em tempo: quem foi o louco que escolheu a cor vermelha para as barracas de alimentação e para a roda gigante? Já que iam invadir o espaço com essa parafernália de mau gosto para papar o níquel dos frequentadores, não poderiam, ao menos, ter escolhido uma cor mais condizente com o local, que, ao invés de o ofender, se integrasse com ele?