Folha não é sujeira!

No dia 8 de agosto passado, uma senhora publicou na página da organização Muda Mooca a fotografia de uma amendoeira com folhas secas ao seu redor. Para além da árvore, via-se uma rua árida, onde o cimento e o asfalto imperam, sob um sol avassalador. A senhora tinha um pedido: tirem essa árvore daqui, olhem o monte de folhas que ela deixa cair na calçada!

Vinheta de Roberto Kroll.

A reação dos seguidores da página foi das melhores: tentaram, por todos os meios e argumentos, convencer a senhora dos benefícios da árvore na frente da sua casa. Provavelmente chocada pela reação adversa que a sua postagem provocou, ela retirou a sua publicação com a fotografia da árvore. Eis aqui o relato interessante e construtivo de Danilo Jack, o criador da organização, num post do dia seguinte:

Hoje farei diferente, irei comentar em primeira pessoa para que possa relatar uma experiência pessoal… sou o Danilo Jack, fundador do Muda Mooca.

Na tarde de ontem, postaram por aqui uma foto de uma amendoeira, juntamente com pedido de substituição, reclamando da fatídica ‘queda de folhas’ que ocorre nessa época do ano…

O curioso é que, bem antes que eu tivesse visualizado o post, centenas de pessoas já haviam comentado que folhas não são sujeira, não entopem bueiros e dão um charme especial às calçadas das cidades européias…

Apareceram comentários de pessoas como a Claudia Visoni, o Nik Sabey, a professora Thais Mauad, o Joubert Trovati, o Lineu Perrone Jr. e o Tiago Queiroz (desculpem por não conseguir citar os demais, pois, infelizmente, o post foi deletado pela autora), em defesa da árvore e com argumentos bastante plausíveis contra o higienismo histérico que tomou conta da sociedade moderna. Só gente da mais alta patente em termos de arborização urbana! Muito grato pelas sábias palavras de vocês, respaldadas por um conhecimento técnico sem precedentes!! Obrigado mesmo!

Aqui no Muda Mooca, diariamente me deparo com mensagens de pessoas que solicitam ajuda para remoção de árvores ou até mesmo substituição, como no caso em tela…

Tenho tentado de todas as formas dissuadir essas pessoas, através de argumentos técnicos, explicando detalhadamente cada benefício que uma árvore adulta proporciona.

Vivemos diante de um perigo invisível, a poluição emitida pelos automóveis chegou a índices alarmantes. A ausência de políticas públicas que visem controlar a emissão de gases tóxicos e a queima de combustíveis fósseis, aliada à precariedade do transporte público e à falta de incentivos para o uso de meios de transporte não poluentes como a bicicleta aumentou consideravelmente os casos de problemas cardiopulmonares nos últimos anos.

Nesse sentido, não nos resta alternativa se não a de plantar mais árvores e de cuidar das que temos. Quem ainda não pensou nesse aspecto, basta se atentar na quantidade de material particulado (fuligem) depositado nas folhas das árvores ao longo de grandes avenidas.

Calçadas áridas na Zona Leste, av. Celso Garcia. Foto: Ricardo Cardim.

 

Para ilustrar o tema, cabe trazer à baila um episódio que ocorreu recentemente:

Certa manhã, recebi uma mensagem de uma senhora insatisfeita com sua árvore, que, segundo ela, “era um pau seco e morto”. Estive no local para verificar a procedência do pedido, e deparei-me com um ipê amarelo muito judiado e com o colo cimentado. Comentei que deveríamos quebrar o cimento em torno do colo e realizar uma adubação, para que começasse a florir no próximo inverno, explicando que os cuidados com a árvore devem ser mensais… A senhora então se zangou, dizendo que não “estragaria” a calçada e nem tampouco gastaria dinheiro com adubo para árvore. Eu expliquei que o adubo é de graça, bastava bater cascas de frutas, restos de salada e cascas de ovos no liquidificador com água e depositar no entorno da árvore (a forma mais rústica e simples de compostagem) e cobrir com algumas folhas. A senhora comentou que não se alimentava de frutas e verduras, portanto não poderia realizar tal procedimento. Ainda nessa seara, disse-lhe que poderia ir até a feira próxima e recolher algumas folhas que são descartadas pelos feirantes. Na mesma toada, a senhora comentou que não frequentava feiras, argumentando que até gostava de árvores, mas não daquela em específico, dizendo que tinha me procurado para substituir a árvore e não para receber dicas de jardinagem… Por fim, agradeci e encerrei a conversa com um questionamento: se a senhora tivesse tido um filho deficiente teria se preocupado em se empenhar para que a criança tivesse uma qualidade de vida melhor ou teria pedido sua substituição na maternidade?

Deixei a pergunta no ar, subi na bicicleta e me pus a pedalar rumo aos meus afazeres diários…

Está na hora de repensarmos qual o legado que queremos deixar para os nossos descendentes e o que realmente é considerado sujeira, pois o homem surgiu na Terra há dezenas de milhares de anos, em meio a florestas e com folhas sob seus pés…”

(Danilo Jack, Muda Mooca, 9/8/2017)

Infelizmente, esses não são casos isolados e acontecem com grande frequência em todos os distritos da capital e até mesmo na gestão de parques. No nosso Parque Ibirapuera, os arbustos e a vegetação baixa em geral estão tristemente desaparecendo. Por quê? Porque a vigilância não é capaz de coibir atos sexuais durante a abertura noturna nos fins de semana, que, apesar das boas intenções, revelou-se um fracasso?

Voltando às folhas secas nas calçadas, sugestão à senhora incomodada: uma varridinha todos os dias vai deixá-la esbelta e em forma e, ainda por cima, vai ajudá-la a economizar dinheiro com a academia…

Moradores de São Paulo e de todo o Brasil: FOLHA NÃO É SUJEIRA!

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