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Na imagem de felicidade, o Parque Ibirapuera é o cenário

por Roberto Carvalho de Magalhães

Pai e filho no Parque Ibirapuera. Fotografia de 1972, cedida por Alexandre Reis (o menino da foto).

Como sempre, uma fotografia pode nos contar muitas coisas. Esta, de imediato, nos conta a felicidade de uma criança de um ano e meio erguida no ar por um pai jovem e também feliz. O menino está com um macacãozinho xadrez; e o pai, de mangas curtas, parece ter um maço de cigarros no bolso, como era frequente décadas atrás. Estamos em 1972, como informa Alexandre Reis, o menino da foto que gentilmente nos cedeu a imagem, agora com 49 anos. Para os “entendedores”, é evidente que a cena feliz se desenrola no Parque do Ibirapuera.

Ao fundo, podemos entrever a Avenida Pedro Álvares Cabral e, mesmo sem vê-la, sabemos da presença da Assembleia Legislativa atrás da fileira de árvores, à direita. À esquerda, ainda que desfocado, intuimos o Monumento às Bandeiras, bem no ponto onde se encontra um coqueiro com a base pintada com cal branca, mania que ainda sobrevive no interior e na gestão de espaços públicos aqui e acolá e que gostaríamos que se extinguisse… Atrás de tudo isso, vemos uma fila de prédios ainda tímida, que sabemos estarem para além da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, acima da Estados Unidos.

É claro que o tema central da foto são o pai e o filho e a felicidade deles. Mas essa felicidade não é favorecida pelo parque que os acolhe e lhes proporciona liberdade de movimentos e gestos? O parque convida à liberdade e esta traz a alegria.

Passaram-se quarenta e sete anos. O verde do Parque Ibirapuera cresceu. Mas também cresceram, desproporcionalmente, a parede de prédios e o tráfego ao seu redor. Como podemos ver em uma fotografia recente, tirada aproximadamente na mesma direção da fotografia de 1972, a parede de prédios, agora, forma quase um muro visual entre o parque e a cidade. Quem morava na região em 1972 sabe que a transição das ruas para o parque, na época, era mais suave.

Parque Ibirapuera nos dias de hoje. Fonte: Ciclo Vivo.

Os quarteirões acima do Círculo Militar, compostos via de regra por sobrados e seus pequenos jardins, deram lugar a condomínios altos circundados por muralhas. O fluxo de carros e ônibus da Avenida 23 de Maio quintuplicou, trazendo não só um barulho incessante, mas também muita poluição. O bairro de Moema também: pouco resta dos seus sobrados com jardins e pululam os prédios “fortificados” e as frentes das atividades comerciais foram cimentadas para o estacionamento dos clientes. E os jardins transformados em áridos estacionamentos de estabelecimentos comerciais e escritórios de vários tipos tornaram-se a tônica da parte baixa da Avenida Brigadeiro Luís Antônio. Ainda resistem heroicamente Vila Nova Conceição e o corredor da Avenida Quarto Centenário, ainda que a invasão de automóveis ocorra por todos os lados.

Em 1972, para se ter uma ideia da transformação, era possível atravessar a 23 de Maio a pé em certos momentos, ainda que não fosse recomendável. A expansão da rede viária e a especulação imobiliária foram cerceando o Parque Ibirapuera. Hoje, ele está sob pressão, como se a cidade quisesse avançar dentro dele e impor-lhe o ritmo frenético e a aridez hostil das ruas.

Ainda é possível levar as crianças ao Parque Ibirapuera, correr com elas nos gramados, lançá-las ao ar, fazendo-as sorrir e mesmo gargalhar com a aventura do voo, como na bela fotografia de Alexandre Reis. Mas essa possibilidade está por um tris. Para que isso continue acontecendo, o Parque Ibirapuera precisa da sua paz, a sua flora e fauna precisam ser intransigentemente preservadas e a cobertura verde, incrementada. De outra forma, a cidade vai acabar estrangulando-o.

Nota: a fotografia de Alexandre Reis foi publicada, inicialmente, na página “AMO SP, fotos antigas da história de São Paulo”.

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