O Parque Ibirapuera é um parque histórico e como tal deve ser tratado

Por que o Parque Ibirapuera deve ser considerado um parque histórico e ser tratado com todo o respeito, cuidados e vínculos que são devidos a todo patrimônio histórico, arquitetônico e cultural em geral? Eis algumas considerações importantes, qualquer que seja o tipo de administração que ele venha a ter no futuro.

Parque Ibirapiera. Foto: Nando Bastos.

Para tombar um monumento, um edifício ou um jardim com as suas esculturas e patrimônio arbóreo, o IPHAN, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional se baseia, especialmente, em dois documentos: a Carta de Veneza, de 1964, e a Carta de Florença, de 1981. Examinemos brevemente os dois documentos.

A Carta de Veneza estabelece que

a noção de Monumento Histórico compreende a criação arquitetônica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acontecimento histórico” (Artigo 1.º); que  “a conservação dos monumentos exige, antes de tudo, manutenção permanente” (Artigo 4.º); e, enfim, que “a conservação dos monumentos é sempre favorecida por sua destinação a uma função útil à sociedade; tal destinação é, portanto, desejável, mas não pode nem deve alterar a disposição ou decoração dos edifícios. É somente dentro destes edifícios que se deve conceber e se pode autorizar as modificações exigidas pela evolução dos usos e costumes” (Artigo 5.º)”.

  • Leia aqui a Carta de Veneza na sua íntegra.

Vista panorâmica do Parque Ibirapuera com o Obelisco e os edifícios projetados por Oscar Niemeyer. Foto: Rafael Neddermeyer.

Enquanto a Carta de Veneza se refere fundamentalmente a “monumentos” e “edifícios” e faz só vagamente referência aos “sítios urbanos” e “rurais”, a Carta de Florença se concentra exatamente nos jardins históricos. Ela determina que

um jardim histórico é uma composição arquitetônica e vegetal que, do ponto de vista da história ou da arte, apresenta um interesse público. Como tal é considerado monumento” (Artigo 1.º). Além disso, “por ser monumento, o jardim histórico deve ser salvaguardado, conforme o espírito da Carta de Veneza. Todavia, como Monumento Vivo, sua salvaguarda requer regras específicas…” (Artigo 3.º)   Objeto especial de atenção são:

“• seu plano e os diferentes perfis do seu terreno;

  • suas massas vegetais: suas essências, seus volumes, seu jogo de cor, seus espaçamentos, suas alturas respectivas;

  • seus elementos construídos ou decorativos;

  • as águas moventes ou dormentes, reflexo do céu” (Artigo 4.º).

  • Leia a Carta de Florença aqui.

Parque Ibirapuera. Foto: site Áreas Verdes das Cidades.

Sem esquecer o fato de que o Parque Ibirapuera é tombado pelo CONDEPHAAT e pelo CONPRESP na sua totalidade – ou seja, edifícios e área verde, incluindo até mesmo a ponte de ferro – e que os edifícios projetados por Oscar Niemeyer nele contidos foram recentemente (maio de 2016) tombados pelo IPHAN, ele tem todos os requisitos dos jardins e monumentos históricos acima mencionados: é um sítio urbano que testemunha um momento histórico importante na cidade de São Paulo – a constituição do maior parque urbano da cidade e de um verdadeiro polo cultural, com os seus museus, o planetário e o Pavilhão Japonês – e o nascimento da nova arquitetura brasileira no desenho de Oscar Niemeyer e no paisagismo que com ela dialoga; por esse mesmo motivo e pela sua função central na criação da identidade de São Paulo – é, sem dúvida, um dos seus marcos –, apresenta um inquestionável interesse público.

  • Veja os documentos de tombamento do Parque Ibirapuera pelo CONDEPHAAT e pelo CONPRESP.

O Parque Ibirapuera não é um lugar de devaneio e entretenimento qualquer. Ele é um marco no desenvolvimento da cidade e um marco da arquitetura, do urbanismo e do paisagismo no Brasil. Por isso, deve ser tratado diferentemente de um parque qualquer. A sua paisagem, os seus diferentes perfis de terreno, a sua vegetação, as esculturas que se encontram no seu perímetro, o desenho original das vias internas, o seu lago e córrego devem ser objeto não só de preservação permanente e de restauração, quando for necessário, mas também deve ter o seu uso limitado às atividades que não alterem o seu caráter de monumento histórico e que não ponham em risco o seu patrimônio vegetal e a sua fauna.

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