Há um grupo no Facebook chamado “Amo SP, fotos antigas da história de São Paulo”. É muito interessante. Nele, os participantes compartilham fotografias da cidade, de décadas e mesmo de um século atrás. Veem-se prédios que não mais existem, avenidas, praças, jardins na sua fisionomia original. Muitas vezes, essas fotos de outrora são acompanhadas de outras fotografias dos mesmos lugares nos dias de hoje.
Ainda que não seja sempre o caso, os comentários expressam, frequentemente, tristeza pelo que se perdeu e a percepção de que aquilo que o substituiu está longe de compensar a perda. Fachadas elegantes e graciosas deram o lugar para letreiros baratos ou portas de garagem sem charme algum; palacetes com estilos que testemunhavam a origem das famílias que aqui fizeram fortuna foram demolidos para que se erguessem prédios via de regra com arquitetura insípida e anônima; jardins particulares que, antigamente, podiam ser admirados da rua por qualquer um tiveram a vista obstruída pelos altos muros em busca de segurança, quando não inteiramente cobertos de cimento para se transformar em vagas para carros; ruas inteiras, bairros inteiros ficaram à mercê da especulação imobiliária apressada, sem planejamento, relegando-os a uma anarquia visual e social sem fim.
A comparação é trágica e induz à melancolia. Perdeu-se quase toda a história arquitetônica da cidade, perderam-se os marcos arquitetônicos, perdeu-se a percepção das origens e os testemunhos do tempo. Perderam-se a flora e a fauna. Perdeu-se a identidade e a sensação reconfortante de pertencimento. A tal ponto que chegou-se até mesmo à criação de falsos históricos para se tentar reatar o vínculo com as raízes da cidade, como no caso do Páteo do Colégio, demolido em 1953 e parcialmente reconstruído de 1954 a 1979.
Sim, a cidade perdeu muito com o descaso pelo patrimônio. Perdeu em beleza, em harmonia, graciosidade, humanidade, cultura, encanto. Tornou-se, visivelmente, uma cidade dura; em grande parte do seu território, desagradável e pouco acolhedora. Perdeu, também, a ocasião de, juntamente com a sua economia industrial e de negócios, ser um centro de referência turística.
Esse descaso e falta de rigor no planejamento está, agora, ameaçando o Parque Ibirapuera. Uma concessão para uma empresa única com fim de lucro, que nem é uma especialista na gestão de parques urbanos, sem um plano diretor sério, põe o parque em grande risco. Aliás, o plano diretor recentemente feito às pressas pela prefeitura, a pedido do Ministério Público, está longe anos luz de garantir: 1) os serviços socioambientais (proteção da fauna e da flora, em prol do bem estar e saúde da população) do parque; 2) a fruição do público sem que seja assediado pela publicidade e pelo marketing; 3) a preservação da sua identidade/fisionomia histórica, que, é sempre bom lembrar, foi objeto de tombamento em três instâncias diferentes: Conpresp (municipal), Condephaat (estadual) e Iphan (federal).
O presente plano diretor não foi feito para preservar o interesse público do parque e muito menos a sua história, mas simplesmente para atender às exigências de lucro da empresa concessionária, com dano assegurado no futuro próximo da própria prefeitura e do contribuinte, ao contrário da desoneração tão reclamizada pela prefeitura para se tentar impor esse projeto nefasto…
Se essa concessão, assim como está elaborada, se concretizar, o belo Parque Ibirapuera como o conhecemos hoje (apesar dos problemas, que podem e devem ser resolvidos, mas com seriedade e honestidade) corre o sério risco de se transformar em mais uma fotografia saudosa no grupo “Amo SP, fotos antigas da história de São Paulo”…