Para uma criança, um lago é o desconhecido; remar, entregar-se à aventura. Viver essa experiência no Parque Ibirapuera já foi possível.
Quando vi essa foto de 1965 (acima), tomei um susto. Fiquei na dúvida se éramos meu pai e eu num barco a remo no lago do Parque Ibirapuera. O menino se parece comigo quando eu tinha sete/oito anos. O homem se parece com meu pai naquela época. Fisionomias, data, idades, lugar, tudo conspirava para que fôssemos nós, pois morávamos a poucos metros do parque e o frequentávamos assiduamente.
Essa fotografia traz, ainda por cima, uma das recordações mais marcantes que tenho do Parque Ibirapuera: foi aí que andei de barco a remo pela primeira vez e onde aprendi a remar. Foi também o aprendizado de que remar não é tão simples assim, que requer coordenação e muito esforço dos bíceps e dos músculos peitorais.
Ainda que não muito grande do ponto de vista de um adulto, o lago do Ibirapuera parece imenso para a pequenez de uma criança. Entrar naquele barco, empurrá-lo para longe das margens, encontrar-se lá no meio, rodeado pelas águas, dava aquele arrepiozinho da aventura, do lançar-se em terrenos desconhecidos e ver o mundo por outras perspectivas. O lago era a separação entre o mundo conhecido e o mundo da aventura. Depois daquela primeira vez, que deve ter ocorrido lá por 1965 mesmo, não via a hora de ir remar, de me afastar dos caminhos seguros, para vivenciar o “perigo”, sulcando as águas do lago!
Depois do susto, fui à procura de fotografias antigas do lago e me deparei com uma em que se vê um barco a motor, com cerca de trinta passageiros, adultos e crianças. Para os mais receosos, era possível passear no lago sem ter que remar. Ao fundo, como na primeira fotografia, vê-se o Monumento às Bandeiras, com as suas possantes figuras empurrando um barco sem nunca sair do lugar, enquanto os barcos no lago do Parque Ibirapuera iam e vinham sem parar…
Pode-se ver esse mesmo barco de passageiros, rodeado por quatro ou cinco barcos a remo, numa fotografia colorida da década de 1970. E, depois, os barcos desaparecem do horizonte, levando com eles os sonhos de aventuras “perigosas” das crianças… Por que isso aconteceu? Por que fomos roubando essas oportunidades das crianças, dos adultos, dos pais com filhos pequenos?
Volto para a primeira foto. Definitivamente, não somos meu pai e eu. Apesar da semelhança, o homem tem uma entrada nos cabelos que meu pai não tinha. O menino… bem, tem o mesmo corte de cabelo que eu tive num determinado momento, mas parece ter mais do que sete anos, a minha idade quando essa fotografia foi tirada. Porém, temos todos algo em comum: os dois pais tiveram a oportunidade e o prazer de levar os filhos para um passeio de barco no lago; os dois filhos viveram a experiência perigosíssima de deixar a terra firme, mas sob a proteção dos pais. No Parque Ibirapuera. Vão levar para sempre essa aventura em seus corações.